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Problemas na nova ordem mundial


Miguel Anxo Bastos Boubeta

Miguel Anxo Bastos BoubetaProfesor de Ciencias Políticas da USC e doutor en Ciencias Económicas


 A emergência da nova ordem multipolar, tão evidente até há pouco tempo, terá, receio, de esperar algum tempo e, se finalmente se concretizar, terá uma configuração diferente da que se pensava. Enquanto o império americano mostra sinais de fraqueza, incluindo a destruição de gasodutos por aliados, está a aguentar-se melhor do que o esperado, a sua alternativa, os países Bric, não só não são coesos entre si, como começam a ter problemas e não conseguem oferecer uma alternativa credível à atual ordem mundial.

O líder do grupo, a China, cresceu no último ano mais do que a maioria dos países ricos do Ocidente, mas menos do que o previsto nas suas próprias previsões. Isto seria bom numa economia convencional, mas não numa que aspira a ser líder mundial, porque se continuar assim atrasará em alguns anos a sua ascensão à liderança económica mundial, se a alcançar, como alguns analistas já duvidam. De facto, está a crescer praticamente ao mesmo ritmo que Taiwan, apesar de este último partir de uma situação de capitalismo maduro, pelo que lhe será muito mais difícil recuperar o atraso económico. A isto juntam-se os problemas económicos decorrentes da crise imobiliária e das políticas de estímulo, que terão o mesmo resultado que as levadas a cabo no Japão, ou seja, nenhum. Este abrandamento do crescimento significa também que o regime chinês não só não tem os mesmos fundos para emprestar como começa a exigir o reembolso do que já emprestou, o que pode asfixiar as economias dos seus parceiros, uma vez que as condições de empréstimo chinesas tendem a ser rigorosas. Países como a Zâmbia e o Sri Lanka já sofreram com isso, e agora outros como o Paquistão e o Laos estão a seguir o mesmo caminho, incluindo Angola. Nestas condições, a China dificilmente conseguirá liderar uma nova ordem. Maduro receberá pouca ajuda efetiva, se conseguir continuar, do grande país asiático. O seu país é agora um lastre para a economia chinesa e esta não está muito disposta a continuar a financiá-lo; já tem problemas suficientes. 
Outro parceiro da nova ordem, talvez o que mais bem a tem teorizado, é a Rússia. Para além dos problemas que tem com a invasão do seu território pelos ucranianos (uma vez que dificilmente conseguirá liderar o que quer que seja se nem sequer tiver meios para proteger o seu próprio território) há o desprezo chinês pelo projeto do oleoduto Power of Siberia 2. Este oleoduto, que deveria ser uma infraestrutura-chave para o transporte de gás russo para a China, foi vetado pelo Governo mongol e adiado sem data, segundo a imprensa, devido à pressão chinesa, que não quer perder o controlo da Mongólia para as empresas russas. Todo o dinheiro investido pela Gazprom, ja altamente endividada, parece estar destinado a ser perdido. Este facto, que não tem sido muito comentado, mostra, em primeiro lugar, que a capacidade de influência da Rússia está no fundo do poço, uma vez que os mongóis parecem preferir obedecer aos chineses, e, em segundo lugar, que a China não é tão amiga do governo russo como parece ser, e que o que parece procurar é enfraquecê-lo para o tornar um vassalo, algo que parece já ter conseguido em boa medida.
E se acrescentarmos a isto a visita do presidente indiano Narendra Modi à Ucrânia e o seu efusivo abraço a Zelenski, isso diz-nos muito sobre qual é a solidariedade entre os arquitetos da nova ordem mundial.